segunda-feira, 10 de outubro de 2016

A arte pulsa na rua Guaicurus: Museu do sexo em BH

 
Espaço difuso é inaugurado com mostra de trabalhos de artistas após imersão em hotel que abriga profissionais do sexo.
Uma série de trabalhos de diferentes linguagens e formatos – vídeo, performance, fotografia, grafite, rádio-novela, lambe-lambes, entre outros – que estão sendo exibidos até a próxima quarta-feira marca o lançamento oficial do Museu do Sexo das Putas, uma iniciativa da Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig) contemplada com recursos do 12º Programa Funarte de Artes Visuais.
Os trabalhos que estão sendo apresentados resultam de uma residência que reuniu, desde o dia 12 de setembro, no hotel Stylus, um dos muitos da região da Guaicurus que abrigam as profissionais do sexo, dez artistas e pesquisadores. A partir dessa imersão, os residentes desenvolveram trabalhos artísticos, especialmente por meio da convivência com as prostitutas. Nesse sentido, tanto os trabalhos do museu quanto sua circulação, online e física, pretendem ampliar o conceito museológico, para que não fiquem restritos a grupos sociais mais intelectualizados.


“O Museu do Sexo das Putas faz parte de um processo de reinvenção do próprio caráter do museu na sociedade contemporânea, invertendo os papéis que geralmente são designados nesses espaços a artistas, como sujeitos, e às prostitutas, reduzidas a tema, ou como objeto. Estamos vivendo um momento de descolonização do museu, das práticas artísticas hierarquizadas”, destaca Camila Melchior, produtora do projeto.
 
Ela explica que desde sua criação, em 2009, a Aprosmig tem sido agenciadora e colaboradora de trabalhos desenvolvidos em muitas áreas do conhecimento e da expressão, como saúde pública, psicologia, antropologia, estudos de gênero, fotografia e música. “Nos últimos anos, o Carnaval e a Virada Cultural na Guaicurus têm mostrado o potencial agregador da Aprosmig. O Museu do Sexo das Putas surge do desdobramento dessas ações que vêm aproximando a associação de tantos outros agentes de campos legitimados socialmente”, diz, destacando que os residentes passaram por um processo seletivo a partir do material que enviaram em resposta à publicação de um edital convocatório para a residência do Museu do Sexo das Putas.
 
Estratégias. Uma das artistas selecionadas, Ana Moravi ressalta a riqueza da experiência. “É uma oportunidade ímpar, porque é um espaço onde não teríamos um trânsito mais aberto, é um espaço onde mulheres não entram a não ser para trabalhar como profissionais do sexo. Isso já estabelece um caráter privilegiado de entendimento do lugar. Morar no Stylus permitiu conhecer de forma mais aprofundada as relações que se estabelecem ali. Nos interessou a forma como essas mulheres criam estratégias para driblar o estigma que existe”, diz. Ela aponta que cada residente adotou um modo particular para lidar com aquele contexto e criar sua obra.
 
Junto com a inauguração do Museu do Sexo das Putas, foi lançado um abaixo-assinado que pleiteia a transformação da região em patrimônio imaterial da cidade. Historiadora entre os artistas residentes, Beatriz Brusantin se ocupou de fazer um levantamento de dados sobre a zona boêmia de BH. Ela destaca a importância do título. “Existe essa proposta de fazer o registro como patrimônio imaterial da rua, como lugar que traz uma memória, traz a história da cidade. Ali na Guaicurus tem a questão relativa aos hotéis, às pessoas que trabalham neles, enfim, a todo um contexto”, aponta, destacando que, no período que empreendeu sua pesquisa, praticamente não encontrou documentos relativos à Guaicurus. “Isso mostra que a história da Guaicurus está praticamente só na oralidade. É uma rua muito importante, que, apesar do estigma, não é uma coisa periférica, liga a rodoviária à praça da Estação. A história da rua tem a ver com a história da cidade e com a história da prostituição”, diz.
 
Êxito na ação da Aprosmig
 
Cida Vieira, presidente da Aprosmig, ressalta a importância da criação do museu como a consolidação de um trabalho que já vem sendo feito há alguns anos. “É a primeira vez que a Funarte reconhece um trabalho de associação de prostitutas em nível nacional. Tem os debates, toda a questão do histórico social, que tem tudo a ver com a arte, a cultura, com o espaço, que já é um patrimônio imaterial, faltando apenas o registro. É o nosso reconhecimento enquanto pessoas, mulheres, artistas. A criação do museu contribui para acabar com o estigma, e contribui para abrir um diálogo sobre a autonomia das mulheres que trabalham com isso”, aponta. Está no ar o site da entidade, museudasputas.wixsite.com/museu.


 
Museu do Sexo
Quando: 7 a 12 de outubro
Onde: Rua Guaicurus, Benfeitoria, centoequatro e Teatro Espanca, em Belo Horizonte, MG
Quanto: Gratuito
Programação completa: http://museudasputas.wixsite.com/museu/programacao
Classificação etária: 14 anos


Fonte: O Tempo

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